LISBOA
UMA
CAPITAL COM PROJECTO, COM GOVERNO E COM FUTURO
Manuel Maria Carrilho
(07/06/2005)
Estou
aqui hoje para vos falar do nosso projecto para Lisboa. E sei que o faço num
momento que é decisivo para a nossa cidade. Decisivo porque se aproxima o momento
de escolher o nosso futuro, de dizer que Lisboa queremos, e esta escolha é cada
dia que passa mais clara para todos: é uma escolha entre duas visões da cidade,
bem distintas e bem diferenciadas.
Por um
lado, temos a Lisboa parada, decadente e desigual, uma Lisboa hipotecada ao
automóvel, ao estacionamento caótico, à degradação do espaço público e à
construção desordenada. É uma Lisboa cada vez mais insegura, mais bloqueada,
mais desleixada, que nos envergonha. Dirigida por um executivo que não consegue
sequer os 50% na execução das actividades programadas, nem os 40% na execução
do investimento previsto.
É uma
cidade que tem sido gerida por impulsos, e exibindo uma confrangedora
incompetência. É esta a marca, é esta também a penosa herança da dupla Santana
Lopes/Carmona Rodrigues: Santana e a peregrinação do Casino, Carmona e as
irresponsáveis trapalhadas do Túnel do Marquês, Santana e Carmona juntos no
embuste do Parque Mayer.
Por outro
lado, temos a Lisboa do futuro, que queremos que seja uma capital com orgulho,
afirmativa e solidária, uma cidade das pessoas, em que a qualidade de vida dos
seus cidadãos – das crianças aos mais idosos – seja o valor fundamental a que
todos os outros se submeterão.
É altura
de devolver Lisboa aos seus habitantes, de cuidar da cidade e de facilitar a
vida dos seus cidadãos. É altura de se redescobrir o prazer, o encanto desta
cidade tão bela, tão diversa e tão singular. É o momento de construirmos uma
Lisboa para os lisboetas : uma cidade em que as constantes imposturas destes
últimos anos dêem lugar a ideias simples e pensadas, a soluções integradas e
concretas, que tenham custos comportáveis e que, acima de tudo, garantam
benefícios evidentes para melhorar a vida, e para garantir os direitos, dos
cidadãos.
É também
altura de dizer basta ao desperdício camarário, que gasta mais em
auto-propaganda do que em serviço aos munícipes – veja-se o que se passa hoje
em dia com os “ecrãs” espalhados por toda a cidade e por todas as estações de
metro, para já não falar nos imensos painéis colocados nas obras e nos prédios
- são milhares e milhares de euros de esbanjamento ilegal e perdulário! E,
entretanto, a dívida da Câmara atinge valores astronómicos, que ultrapassam já
os 200 milhões de euros.
Os
lisboetas não querem mais disto, não querem mais do mesmo, não querem mais
intrujices e buracos intermináveis, não querem mais passa-culpas e responsáveis
em vai-e-vem, não querem uma capital sem alma nem ambição.
E todos
sabemos muito bem quem são os responsáveis, os grandes responsáveis pelo caos e
pelos impasses em que a cidade vive hoje. E mais – sabemos também que, como diz
o povo num fino e apropriado provérbio, “tão ladrão é o que vai à horta como
quem fica à porta…”! Apesar de tudo, é preciso reconhecê-lo, ele parece que não
quer ficar à porta!...
Vem agora
propor um “pacto de regime” …não é, no entanto, uma proposta que mereça
atenção, tão evidente que é o expediente politiqueiro. E um pacto de regime,
para quê? Para consagrar as trapalhadas, para branquear a incompetência e para
esconder o esbanjamento da sua gestão?
Agora é
altura de optar, e de optar entre o caos e o projecto, entre mais do mesmo e a
ambição de fazer melhor, de ser melhor, de viver melhor. Entre quem já está e
finge não ter responsabilidades sobre nada, e quem dá a cara por um ideal.
Entre quem se esconde atrás da irresponsabilidade dos outros e quem não tem
medo de se apresentar como um uma alternativa real para o futuro.
NOVAS
POLÍTICAS PARA A CIDADE
Deixemos
contudo o passado aos que prometem apenas, e sempre, mais do mesmo: Carmona
Rodrigues já se propõe, de resto, continuar o Túnel de Marquês com o Túnel do
Saldanha, numa involuntária confissão de que o que ele sonha para Lisboa são
mais buracos, mais trapalhadas e mais esbanjamento.
A nós,
pelo contrário, o que nos motiva é o futuro, é o relançamento de Lisboa com uma
nova ambição, uma nova visão, um novo projecto para a cidade.
E
falemos, então, do nosso projecto. Ele está aí, nos cartazes, espalhado pela
cidade, porque ele é para levar a sério: o nosso projecto para Lisboa consiste
numa visão articulada das propostas com que pensamos resolver os principais
problemas da cidade.
Ele
comporta três dimensões fundamentais. Em primeiro lugar, a do desígnio de
Lisboa como uma cidade mais solidária, mais competitiva e mais cosmopolita.
Seguidamente, a de um método para responder aos problemas concretos que
valorize a proximidade com a cidade e com as pessoas. Por fim, a da excelência
das equipas, que ponha um ponto final na incompetência que tem devastado a
gestão da cidade de Lisboa: equipas sérias, qualificadas, competentes, que
garantam uma administração transparente e eficaz.
É este o
projecto, é com ele que nos apresentamos à cidade, é com ele que iremos
alimentar o nosso diálogo com todos os seus habitantes, é com ele que iremos
enquadrar as novas políticas que hão-de ser a base da Lisboa do futuro. Entre
estas, quero adiantar já hoje algumas das mais estruturantes.
No cerne
do nosso projecto estará, naturalmente, uma nova orientação, que assumirá o
papel urbanizador que a Câmara deve ter em nome do interesse público, rompendo
com o perfil demissionista e cada vez mais loteador do actual executivo.
O nosso
projecto para Lisboa passa pela afirmação inequívoca de um novo urbanismo, em
que os aspectos ambientais, culturais, arquitectónicos e humanos se entrecruzem
e estejam presentes em todas, e em cada um, das decisões que venham a ser
tomadas sobre o futuro da cidade.
Lisboa é
uma cidade única pela sua localização atlântica, pela sua estrutura física
ondulada, pelo enorme lençol de água do Tejo – esse pequeno Mediterrâneo, como
inspiradamente o designou Cláudio Torres -, pela história que emerge das suas
ruas, dos seus bairros, pelas gentes que a habitam e que, de há muito, aqui se
juntaram, provenientes de todo o país e de todo mundo. Há pois que pensar a
cidade na sua complexidade, na diversidade das suas gentes, apostando
decisivamente num modelo de urbanismo que assente em dois pilares fundamentais:
a importância da paisagem e a sustentabilidade do território.
A cidade
de Lisboa desenvolveu-se a partir do estuário do Tejo, na ligação deste com as
encostas das colinas a ele expostas, mas, com o advento do desenvolvimento
industrial, a relação natural da cidade com o rio foi cortada. A enorme
extensão da frente ribeirinha – 17 km - representa hoje um enorme potencial de
revitalização ambiental e urbana que não pode continuar a ser desperdiçado, nem
a ser objecto de aproveitamentos fortuitos e desenquadrados de uma visão global
para toda aquela área. Propomos, por isso:
-
a criação
de um “parque urbano ribeirinho”, que vá desde a Expo até à Docapesca,
harmonizando diversos usos e funções e que permita a sua fruição pelos
cidadãos;
- o estabelecimento de percursos pedonais e de ciclovias, de pontes ou passadiços que assegurem a ligação entre a cidade e o rio e entre as diferentes áreas do parque urbano ribeirinho;
- a promoção de actividades náuticas, de recreio e de turismo, concessionando-se a actividade de táxis-barco no Tejo;
- a reavaliação dos projectos imobiliários previstos para a proximidade da frente ribeirinha, que deverão contemplar uma grande diversidade de oferta, e não pôr em causa a ligação da cidade com o rio;
Não podemos esquecer que a ligação de Lisboa ao Tejo se faz primordialmente através do eixo que desemboca no Terreiro do Paço e que se prolonga pelo Rossio, pela Av. da Liberdade e que termina no alto do Parque Eduardo VII.
Há, pois,
que recentrar a cidade em torno deste eixo prioritário que atravessa a Baixa
Pombalina, retomando e incentivando algumas das funções que foram desaparecendo
com o surgimento de outros pólos de atracção urbana. Foi já tendo presente esta
ideia de uma grande aposta na Av. da Liberdade e nos espaços envolventes, que
propus, para acabar com os intermináveis imbróglios do Parque Mayer, um jardim
que dê continuidade ao fantástico Jardim Botânico que lhe é contíguo, bem como
a recuperação do Capitólio. Solução que tem também a virtude de cortar com o
esbanjamento de 350 /400 milhões de euros!
Este
recentramento da cidade implica ainda outras medidas, entre as quais destaco a
valorização do Terreiro do Paço como centro político e administrativo por
excelência, sem prejuízo da afectação de algumas áreas situadas nas arcadas
para outros usos. O Terreiro do Paço tem uma área de 100 mil m2, que devidamente
modernizada e utilizada pode comportar cerca de 4.000 empregos.
Este
dado, se bem articulado com a valorização do espaço público envolvente, com a
modernização do comércio e com a dinamização dos equipamentos culturais
existentes, poderá ser absolutamente decisivo para a requalificação, o
repovoamento e, portanto, para a revitalização global da Baixa, seja em temos
de ocupação residencial, de instalação de pequenos hotéis de charme ou da
sediação de empresas.
A cidade
tem de se desenvolver de forma harmoniosa, equilibrada, sustentável,
assegurando a qualidade de vida dos seus habitantes e evitando danos ambientais
que ponham em causa o nosso futuro colectivo.
A
situação privilegiada de Lisboa, a sua morfologia e posição geográfica, bem
assim como a diversidade da malha urbana, matizada de pequenos quintais junto
aos edifícios da cidade antiga, ou de logradouros situados no interior dos
quarteirões da cidade moderna, constituem um património ambiental único que não
pode continuar a ser destruído.
Mas, para
além da preservação desse património, há que apostar decisivamente num
urbanismo sustentado que privilegie o espaço público e estabeleça uma
articulação entre o sistema natural e o edificado, dando prioridade à Estrutura
Ecológica Urbana, componente ambiental do PDM.
Com esse
objectivo, propomos um conjunto de medidas que façam de Lisboa uma cidade
exemplarmente amiga do ambiente:
-
a
articulação dos espaços verdes públicos e privados, definindo percursos
contínuos que permitam a ligação entre diferentes zonas da cidade;
- a recuperação do projecto do Parque Periférico, com o que resta das suas quintas e azinhagas, qualificando os novos bairros que foram sendo construídos de forma desordenada na orla da cidade;
- a recuperação do projecto do Parque Oriental, promovendo a articulação dos parques existentes (Alvalade, Bela Vista,…) com outras estruturas naturais, até à zona ribeirinha oriental;
- a conclusão do corredor verde Av. da Liberdade/Monsanto e a consolidação deste como grande parque da área metropolitana, sujeito a um projecto integrado;
- a reconfiguração do corredor verde do Vale de Alcântara, com a renaturalização da ribeira e a criação de bacias de retenção de água;
- o reforço da plantação de árvores em toda a cidade, em particular na (re)criação de alamedas nos principais eixos viários.
No que se refere aos bairros de Lisboa foi crescendo por bairros, cada um com a sua identidade própria, e a história da cidade pode contar-se através da história dos seus bairros.
Hoje em
dia, contudo, a vida e a imagem desses bairros já não é o que era: a população
envelheceu - múltiplos factores dificultaram a permanência dos jovens na
cidade; os edifícios degradaram-se por razões que são conhecidas; os novos
hábitos de vida conduziram ao individualismo e ao estilhaçar das relações de
vizinhança; operações urbanísticas e de infra-estruturas, desadequadas e
desatentas ao sítio, provocaram rupturas e destroçaram a coesão do bairro; um
sentimento generalizado de insegurança fechou os seus habitantes em casa e
transformou as ruas em locais perigosos e pouco apetecíveis.
Há que
mudar tudo isto e intervir rapidamente com um objectivo claro e simples – o de
humanizar os bairros, torná-los seguros e vividos, apostar na requalificação do
espaço público como forma primeira de devolver a cidade aos seus habitantes.
Cada
bairro tem os seus problemas específicos e qualquer intervenção tem de assentar
num planeamento integrado e sistémico, não subordinado a projectos de mera
especulação imobiliária, assegurando a revitalização do tecido urbano a qual,
para além da mera renovação física, tem em vista a eliminação de factores de
exclusão e o fomento da coesão social.
Há os
bairros da cidade histórica (como a Mouraria, Alfama, a Madragoa, o Bairro
Alto), cujo valor simbólico nunca é de mais realçar, que mantêm uma forte
cultura de bairro mas que necessitam de operações profundas de regeneração
urbana, que não as de mera cosmética de embelezamento de fachadas, de modo a
tornar a sua vivência atractiva para as novas gerações e permitir um aproveitamento
turístico que não descaracterize a identidade do sítio.
Os
bairros da cidade moderna (as Avenidas Novas, Alvalade, Campo de Ourique, os
Olivais, entre outros) integram igualmente a cidade consolidada mas, por terem
um passado histórico recente e se terem desenvolvido já na «modernidade», ainda
não foram objecto de operações de requalificação integradas. Na maior parte dos
casos, encontram-se degradados, muito pressionados pela circulação automóvel,
alguns deles atravessados por novas redes viárias que os desqualificaram e a
sua desertificação é crescente.
Mas há
ainda que ter especial atenção aos bairros esquecidos (por exemplo, Marvila,
Xabregas, Chelas), abandonados à sua sorte por estarem afastados do centro e
serem habitados por uma população de fracos recursos económicos. Acresce que em
alguns deles se localizaram grandes operações de realojamento que não foram
acompanhadas da construção de espaços públicos, nem da implantação de
equipamentos colectivos que solidifiquem os laços entre os seus habitantes e
inculquem o sentimento de pertença ao bairro.
Na orla
da cidade consolidada, as novas urbanizações têm-se sucedido a um ritmo
vertiginoso, numa lógica de construção lote a lote, sem definição prévia de um
plano que assegure a sua sustentabilidade. Estes bairros periféricos têm de ser
integrados num conceito de cidade, articulados com a estrutura verde que ainda
resiste, numa procura de melhoria da qualidade de vida dos seus residentes.
Algumas
medidas concretas se podem apontar desde já, sem esquecer que elas não podem
ser vistas isoladamente, mas que decorrem de uma visão global da cidade:
-
assegurar
a pronta revisão do PDM, com base em princípios de sustentabilidade, que
permita gerir com detalhe os processos de renovação, estabilização e expansão
do tecido urbano;
- desenvolver operações integradas de reabilitação em função de eixos de carácter histórico-patrimonial, sem aumentar a densidade ou degradar a escala e a imagem da cidade tradicional (ex.: Av. da Liberdade, Av. Almirante Reis, R. das Portas de Santo Antão, …);
- preparar uma intervenção global na zona Intendente, através de um plano especial para a zona, que enquadre uma acção consistente e pluridisciplinar de reconversão sócio-urbanística do local, desenvolvendo programas de apoio, não só aos toxicodependentes mas também aos moradores;
- valorizar a rua como elemento estruturador do tecido comercial nas áreas tradicionalmente dedicadas a este sector de actividade (a Av. de Roma, a Av. Guerra Junqueiro, a Rua Ferreira Borges, por exemplo);
- desenvolver o conceito de “centro comercial” a céu aberto;
- humanizar os bairros, apostando na requalificação do espaço público – uma praça em cada bairro não é um objectivo utópico - e fomentando a participação cívica na gestão dos espaços colectivos;
- criar redes de novos tipos de equipamentos comunitários que incentivem a criatividade e propiciem o convívio inter-geracional;
- estabelecer percursos de ligação pedonais e cicláveis entre os diversos bairros;
- criar espaços abertos nas áreas históricas, demolindo edificações sem interesse, aproveitar o interior dos quarteirões nas áreas consolidadas e recuperar os descampados nas franjas das novas urbanizações de modo a proporcionar amplos espaços públicos ou jardins que sejam usufruídos por todos;
- aproveitar antigas instalações militares, industriais ou portuárias desactivadas, atribuindo-lhes novas funções de utilização colectiva.
Numa breve nota, quero referir ainda que Lisboa precisa de alargar o seu “espaço interior”, e que pode e deve fazê-lo transformando a 2ª Circular numa grande avenida urbana em comunicação com as áreas envolventes, através de pequenas intervenções de grande alcance.
Insisto
: só numa
perspectiva integrada é que os problemas terão solução. Por isso, para dar
resposta aos problemas de mobilidade que Lisboa enfrenta, é vital reduzir o
número de automóveis que diariamente entram em Lisboa – e eu assumo que nós
iremos reduzir para metade esse número – que hoje ronda os 400 mil – no espaço
de um mandato.
É preciso
também agilizar a circulação dos transportes públicos, nomeadamente aumentando
as faixas “bus”- e eu garanto que nós iremos duplicá-las nos próximos quatro
anos.
É também
necessário apostar, a exemplo de tantas cidades europeias, no transporte de
superfície não poluente, nomeadamente nos eléctricos;
É ainda
preciso acabar com o estacionamento selvagem, e eu asseguro que declararei a
tolerância zero nesta matéria, e que criaremos mais parques para residentes e
providenciaremos para que os parques existentes criem um regime especial para moradores
na respectiva área.
Vamos
acabar com a ineficácia do actual sistema de pagamento de estacionamento em
parquímetro, instituindo um modelo mais simples e mais eficaz, o «Parqueamento
Móvel» (Este é um sistema que opera através de tecnologia SMS, WAP ou de
reconhecimento de voz, substituindo os actuais «tickets» e parcómetros. Este
modelo, já introduzido com enorme sucesso em países como a Noruega, ou em
capitais como Viena (Áustria), tem duas vantagens principais que gostaria de
realçar: primeiro, é mais justo e mais cómodo para o automobilista,
permitindo-lhe pagar apenas o período de utilização efectiva do estacionamento
e, além disso, prolongar livremente ou encurtar esse período, sem ser
necessário deslocar-se ao parque onde está o automóvel; segunda, é mais barato
e mais produtivo, podendo instalar-se num curto espaço de tempo sem necessidade
de investimento municipal relevante (em hardware, software ou pessoal de apoio)
e podendo provocar aumentos imediatos nas receitas municipais na ordem dos 15%)
A
segurança será também uma das nossas prioridades, porque não há liberdade sem
segurança. Mas a insegurança não decorre apenas do maior ou menor policiamento,
como muitas vezes erradamente se diz, mas de um conjunto de factores que é
preciso combinar estrategicamente, e que vão desde a falta de iluminação
pública até à degradação habitacional e à falta de actividades.
É tendo
presente este conjunto de factores que é preciso actuar. Nas zonas mais
problemáticas não devemos, contudo, hesitar em recorrer a mais e melhor
policiamento - nomeadamente de proximidade - e, mas situações mais crónicas e
graves, a dispositivos de vídeo-vigilância, a exemplo do que acontece em tantas
cidades, como Londres ou o Rio de Janeiro.
É também
urgente retomar o combate à toxicodependência, acabando com a hipocrisia e o
demissionismo dos últimos anos. Os bons resultados anteriormente obtidos nesta
área conheceram um dramático retrocesso desde a chegada da direita à Câmara.
Tudo foi cancelado, sem que se tenham criado alternativas, e com as
consequências que hoje são dramaticamente visíveis na Almirante Reis e no
Intendente.
Temos
pois que retomar a inspiração e o trabalho interrompido, reactivando e
alargando as “equipas de rua” e os “pontos de contacto”, avançando no sentido de
respostas mais eficazes que a legislação existente já permite, e que têm sido
testadas com sucesso em muitas cidades europeias.
As
políticas de solidariedade precisam, em Lisboa, de mais apoio e de mais
coordenação. De mais apoio do Estado e da Câmara, mas também das empresas – a
problemática da coesão social deve estar sempre no cerne das preocupações de
competitividade.
Há,
todavia, situações que temos que considerar como intoleráveis neste começo do
século XXI: são situações de pobreza extrema, de exclusão social dramática.
A Câmara
deve assumir um papel activo, mais, um papel liderante, no combate às situações
de exclusão social, com base numa estratégia inclusiva orientada para a
prevenção, mas sem descurar a resposta aos graves problemas existentes.
Nesta
área, a Câmara Municipal de Lisboa irá elaborar um Programa de Garantias
Sociais, que dê forma a uma estratégia de acção social integrada, e que deverá
contemplar o maior número possível de situações que afectam hoje a dignidade
dos cidadãos mais carenciados de Lisboa.
Neste
sentido, introduziremos na acção municipal medidas que reforcem a qualidade
habitacional, a mobilidade e a qualidade de vida dos mais idosos, numa
perspectiva que dê sentido à enorme conquista civilizacional que o
prolongamento da idade média de vida indiscutivelmente constitui.
Avançaremos
também com iniciativas de complementaridade idosos/crianças, nomeadamente no
quadro da nova prioridade que já anunciámos para a acção da CML, a de uma
política da criança e da escola que seja exemplar no nosso país.
Eis o
projecto a entrozar-se com a realidade, eis as nossas propostas para resolver
os problemas mais difíceis da cidade, eis um mobilizador horizonte de diferença
e de esperança para os lisboetas.
Neste
quadro, Lisboa pode tornar-se, por vontade, energia e imaginação dos seus
habitantes, e em particular dos seus jovens, numa outra cidade. Numa cidade que
se projecte no País e na Europa, no espaço da Lusofonia e no Mundo, com outros
meios e outra ambição. É preciso pôr de novo Lisboa no mapa da Europa, da
Lusofonia e do Mundo.
Temos na
Lusofonia raízes mundiais - o que no mundo globalizado de hoje é um trunfo
extraordinário, e temos na Europa um espaço de excepção para a nossa afirmação:
é pois aqui que se encontram a matriz e os desafios do nosso cosmopolitismo.
Cidade de
cultura, Lisboa deve dinamizar mais a sua actividade regular, mas também
promover novos festivais, bienais e intercâmbios vários, que dêem uma projecção
internacional constante à sua múltipla criatividade. Se o fizer, Lisboa pode
tornar-se - e nós queremos que isso aconteça - na capital europeia da
diversidade.
É também
fundamental valorizar o nosso património e qualificar a oferta, nomeadamente no
que se refere aos museus, decisivos numa cidade de turismo como é Lisboa. E
aqui, quero assumir mais um compromisso muito concreto: o de, em natural
parceria com o Ministério da Cultura, promover à instalação definitiva em
Lisboa da Colecção Berardo. Lisboa nunca terá um perfil de capital europeia se
não tiver à disposição dos seus habitantes, e dos seus visitantes, um
verdadeiro Museu da Arte Contemporânea.
Lisboa
aproxima-se de um momento muito importante da sua história, e da história do
nosso país: 2010 será o ano, a data em que se festejará o 1º Centenário da
República. Devemos preparar a comemoração deste evento desde já. Logo a seguir
às eleições de Outubro, proporemos a formação de uma comissão conjunta, da
Câmara e do Governo Central e da sociedade civil, que prepare com a dignidade e
a imaginação que a data aconselha, um grande programa de eventos, de obras e de
ideias, para que Lisboa viva de um modo empenhado, festivo e concretizador, o
1º Centenário da nossa República.
UM
PROJECTO DE FRONTEIRA
Eis
algumas opções bem diferenciadoras da Lisboa do futuro que queremos construir.
Mas elas só ganham todo o seu sentido num contexto que, pelas suas incidências
políticas, não posso deixar de abordar. E concluirei com este ponto.
É que o
projecto que apresentamos para Lisboa é também um projecto de fronteira, de
capitalidade e de governo.
É um
projecto de fronteira, que nasceu há mais de um ano através do incentivo de
muitas pessoas para que eu me disponibilizasse para concorrer à presidência da
Câmara Municipal de Lisboa. Decidi fazê-lo, por vontade e risco próprios, em
Janeiro de 2004, manifestando publicamente a minha disponibilidade para tal,
enquanto militante do PS.
Em
Fevereiro deste ano, esse incentivo foi reforçado por um apelo público, o
«Apelo por Lisboa», apresentado por mais de 30 destacadas personalidades da
cidade – como José Saramago, Bruto da Costa, António Lobo Antunes, Jorge
Gaspar, Gonçalo Byrne, Manuel João Ramos, Inês Pedrosa, Emídio Rangel ou João
Nabais, entre outros –, a que se seguiu a adesão de muitos, mais de mil
cidadãos de Lisboa.
Mais
tarde, em Abril deste ano, por escolha colegial do PS e do seu
Secretário-Geral, fui designado candidato pelo PS. E, logo depois, dei início -
no seguimento dos trabalhos do “Forum Cidade” - a um alargado fórum
participativo de debate, que decorreu intensivamente durante todo o mês de Maio
- as «Jornadas Lisboa com Projecto» -, a que aderiram mais de 500 técnicos,
apresentando contributos muito relevantes nas mais diversas áreas sectoriais.
Relembro,
pelo seu simbolismo, e através deles agradeço o envolvimento de todos, a
participação de pessoas como Daniel Sampaio, Elisa Ferreira, Augusto Mateus,
Simoneta Luz Afonso, Carrilho da Graça, Maria de Belém, Nunes da Silva, Manuel
Salgado, Manuela Silva, Miguel Lobo Antunes, Fonseca Ferreira, Nuno G. Ribeiro,
Manuel Graça Dias, Carlos Monjardino, José António Pinto Ribeiro, Rui Valada,
Eduardo Prado Coelho, Elza Pais, Gomes de Pinho, Paulo Pereira ou Aires Mateus.
Se digo
que este é um projecto de fronteira, é porque uma nova fronteira se abre hoje
entre a sociedade civil e os partidos políticos, entre o exercício do poder e a
participação dos cidadãos, entre a forma tradicional de fazer política e um
novo paradigma de fazer cidade.
Uma
projecto de fronteira que é também uma nova oportunidade e uma nova aspiração:
uma oportunidade de acelarar a revitalização do PS no quadro de uma inevitável
renovação do sistema partidário, uma aspiração de mais estímulo à participação
cívica e de mais mobilização da sociedade civil, dos seus agentes mais críticos
e mais activos, dos seus membros mais novos e mais dinâmicos, dos seus quadros
mais exigentes e mais qualificados.
Uma nova
fronteira em que ser jovem, ser contemporâneo e ser irreverente, não é estar
fora da política, das decisões colectivas e dos projectos de vida comuns, mas
antes transformar e inovar por dentro do sistema, com e através dos partidos,
com e através do exercício do poder, com e através de todos.
UM
PROJECTO DE CAPITALIDADE
O
projecto para Lisboa é também, em segundo lugar, um projecto de capitalidade.
Lisboa não pode ser a capital do país apenas pelo seu lastro
político-administrativo. Se Lisboa concentra um parte muito relevante dos
recursos nacionais – tem um PIB per capita superior à média nacional e idêntico
à média EU -, e concentra, além disso, um número significativo dos recursos
humanos mais qualificados, um património único, uma parte significativa da
nossa memória e identidade –, Lisboa deve usar esses trunfos em benefício do
país.
Sabendo-se
que muitas cidades, e nomeadamente cidades capitais, geram hoje dinâmicas e
redes de poder e de riqueza concorrentes e complementares às dos países a que
pertencem, também em Lisboa há que assumir um novo paradigma da capitalidade,
que não se pode esgotar na sua força político-administrativa.
Um novo
paradigma de Lisboa capital deve ser um paradigma em que Lisboa se afirme na
liderança inter-municipal e nacional de uma estratégia urbana competitiva, de
desenvolvimento sustentável e de coesão social. Ou seja: Lisboa deve ser o
rosto de Portugal no mundo, o motor do desenvolvimento nacional, o propulsor do
crescimento económico do país, o padrão da qualidade de vida, o exemplo da
integração social e a montra da nossa excelência e cidadania.
Um novo
paradigma de Lisboa capital deve ser um paradigma em que Lisboa cresça
rapidamente, seja mais produtiva e criativa, produza mais riqueza, crie mais
emprego, fertilize mais conhecimento, fazendo de Portugal um país mais forte,
mais rico e mais justo.
Esta deve
ser a obrigação da cidade e o seu contributo para a estratégia de crescimento
nacional. Mas para isso a cidade também tem que ser o «centro» do espaço
metropolitano que a envolve, tem que liderar, com competência e sem medo, a
estratégia e as políticas regionais e inter-municipais, dos transportes ao
planeamento territorial.
Lisboa
deve utilizar os seus recursos na execução de um política própria, sem receio
de ser concorrente sempre que esse seja o melhor modo de ser complementar em
relação à política e às condicionantes financeiras do governo central. Uma
Lisboa que perspective os problemas como oportunidades únicas, as incertezas
como uma inevitabilidade numa cultura societário de risco e de mérito, a
concorrência internacional como um estímulo ao aumento da cooperação e da
internacionalização, e que saiba privilegiar o investimento «inteligente»,
sobretudo aquele, que faz muito com muito pouco, que inova e que gera riqueza
num quadro sustentável.
A
política é sempre a arte de gerir escassez, de investir no que faz falta e no
que cria riqueza. Mas o que mais escasseia em Lisboa - digo-o sem receios de
parecer em contra-corrente – não são meios ou activos para investir. O que mais
tem faltado em Lisboa é critério, organização e rigor.
Dou
apenas três exemplos:
Primeiro,
de acordo com um estudo recente, uma central de compras electrónicas pode
racionalizar em 15 a 25% o total da despesa da CML, o que significa uma redução
de custos superior a 60 milhões de euros, montante este que se liberta para
investimento noutras áreas; para que haja um indicador comparável, só os
pilotos de compras da UMIC nos Ministérios introduziram 30% de poupanças;
Depois,
segundo um outro estudo, encomendado pela própria Câmara à McKinsey,
verificamos que o valor perdido em multas de estacionamento não cobradas num
ano pode representar cerca de 166 milhões de euros, isto é, aproximadamente 37%
da receita corrente da CML de 2005;
Terceiro,
as receitas médias da EMEL por lugar de estacionamento têm vindo diminuir
drasticamente dos cerca de € 4 por lugar/dia para os actuais € 0,8 – imagine-se
o potencial de captação de receitas que um modelo como o «Parqueamento Móvel»
não tem, e isto sem falar na comodidade e na justiça que introduz na relação
com os munícipes.
O que não
pode fazer pela cidade uma utilização criteriosa destes recursos? E o que não
pode fazer pelo País, uma cidade que se afirme no exterior e que cresça mais
depressa e melhor do que o país? Não tenhamos dúvida: uma melhor capital fará
sempre um país melhor.
UM
PROJECTO DE GOVERNO
Por
último, o projecto para Lisboa é, ainda, um projecto de governo de cidade: ou
seja, é um projecto de mudança e não de resistência, é um projecto de
transformação e não de conformismo. De mudança e de transformação no sentido da
eficiência, da proximidade e da transparência:
-
da
eficiência na gestão dos recursos da CML, que qualifique e motive os seus
recursos humanos, que optimize as suas finanças reduzindo os prazos médios de
pagamento e recebimento, que reduza as necessidades de tesouraria e regule o
crescimento explosivo do passivo financeiro, que diminua e simplifique os
prazos e processos de licenciamento e de funcionamento burocrático. É preciso
fazer mais com menos, e melhor com o que tem e com o que há.
- da proximidade, promovendo agregação – iremos fazê-lo - de freguesias em “Distritos Urbanos” que, com maior proximidade aos moradores, poderão receber mais competências e mais recursos para agirem. Governar de um modo mais descentralizado e que esteja mais perto de quem vive na cidade. E que estimule a proximidade, quando ela ajuda, mas que a evite, quando ela prejudica: por exemplo, abrindo novos canais de relação com o munícipe, um Sistema Integrado e eficaz de Atendimento Municipal (SIAC), ou um portal da região, promovendo-se a utilização das TIC por forma a aumentar o conforto, a proximidade e o fácil acesso à informação e ao conhecimento.Mas um governo da cidade que também contribua para resolver de forma integrada os problemas da cidade e da Área Metropolitana de Lisboa, que pense a parte a partir do todo, e que no todo deve vir a ter um papel de liderança: nomeadamente no Metropolitano, na Carris, e na Administração do Porto de Lisboa.
- da transparência, porque não há democracia em segredo. Transparência nas decisões, nos processos e nas informações. Devem multiplicar-se as consultas à população e a disponibilidade para a ouvir - deve instituir-se o Conselho da Cidade -, deve incrementar-se o licenciamento na Internet bem como a informação sobre o estado dos processos. Deve simplificar-se a relação com a Câmara através de modelos de «self-service», deve preparar-se uma iniciativa (como se fez em Barcelona) de Câmara Aberta, isto é, de um governo municipal que não só presta contas do que faz, e de como faz, como em certos dias do ano abre os próprios Paços do Concelho ao munícipe para que ele observe, directamente, as rotinas de trabalho e de serviço na Câmara.
A opção eleitoral do próximo mês de Outubro é clara: quem tiver mais votos, sejam dezenas ou milhares, será presidente da CML. Conhecemos a alternativa: o próximo Presidente da CML serei eu, ou que será a «sombra» do que está em funções “por aí”. As regras eleitorais são implacáveis e as coligações pós-eleitorais só poderão servir para reforçar a base do vencedor, nunca para fazer governar uma coligação de vencidos.
Será uma opção entre quem abre buracos que custam milhões de euros (que ninguém sabe para que servem) e quem sabe que terá de governar com pouco e fazer muito. Entre quem se gaba de não saber fazer exercícios intelectuais e quem acredita que pensar, e pensar bem, faz parte do trabalho de qualquer governante. Entre quem sonsamente finge não ser político e quem acredita que a política deve ser um modo tão assumido com desprendido de servir os outros.
Será, em suma uma opção entre o marasmo actual e um projecto de futuro: um projecto para governar a cidade, que é também um projecto colectivo e que será colectivamente executado, por um equipa que em breve apresentarei.
Um governo da cidade que reunirá os, e as, mais qualificados, mais promissores e experientes para fazer cidade. Um governo que saiba combinar a visão que alimenta a esperança com a vontade que garante a mudança, saiba articular a coragem de reformar com a capacidade de inovar.
Um governo da cidade de que serei o primeiro responsável e o principal rosto, fiel à máxima de dizer sempre o que penso e de fazer sempre o que digo. E que, garanto-vos, será competente, conhecedor dos problemas, humanista, aberto e participativo, capaz de, finalmente, concretizar no dia-a-dia o projecto de fazermos de Lisboa a cidade mais solidária, mais competitiva e mais cosmopolita com que todos sonhamos.
(Intervenção na apresentação pública da candidatura de Manuel Maria Carrilho ao cargo de Presidente da Câmara Municipal de Lisboa.
Centro Cultural de Belém)
Tugir
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